Em 2011, 34% do aumento da demanda agregada foi atendido por
importações, percentual que impressiona pela magnitude, mas principalmente pela
velocidade com que se amplia. A produção industrial encontra-se hoje
praticamente no mesmo patamar existente antes da crise de 2008. Na primeira
metade de 2012, o comércio internacional dos produtos típicos da indústria de
transformação teve déficit de US$ 27,6 bilhões, recorde para o período. A
balança comercial só continua superavitária devido ao intercâmbio de bens
intensivos em recursos naturais, commodities agropecuárias, energéticas e
minerais, cujas exportações chegaram a US$ 49,3 bilhões no primeiro semestre de
2012. Se não são definitivos, estes dados apontam para um processo de
desindustrialização no país.
Mas um país precisa mesmo de indústria? Porque não importar
todos os produtos industriais que o Brasil necessita, da Ásia, que pretende ser
a fábrica do mundo? Se os produtos industriais importados são mais baratos que
os produzidos internamente qual a necessidade do país ter indústria? Bem, há
alguns bons motivos para a defesa do setor industrial do país, dos quais
listamos alguns:
1º) Não há registro na história, de nenhum país que tenha
chegado ao desenvolvimento econômico e social, sem uma generalizada
industrialização e um forte e ativo Estado Nacional. Mesmo economias que
utilizaram mais as exportações de produtos primários para elevar a sua renda
per capita (como Austrália e Canadá), antes atravessaram por períodos de
elevada diversificação industrial, elemento essencial das suas estratégias de
desenvolvimento;
2º) Existe uma relação empírica entre o grau de
industrialização e a renda per capita, tanto nos países ricos, quanto nos
países em desenvolvimento;
3º) Há uma associação estreita entre o crescimento do PIB e
o crescimento da indústria manufatureira. A dinâmica da economia brasileira,
neste momento, ilustra o fenômeno. O produto não está crescendo, em boa parte,
porque a indústria de transformação está estagnada;
5º) A produtividade é mais dinâmica no setor industrial do
que nos demais setores da economia, é o setor industrial que puxa o crescimento
da produtividade da economia;
6º) O avanço tecnológico que se concentra no setor
manufatureiro tende a se difundir para outros setores econômicos, como o de
serviços ou mesmo a agricultura. Os bens com maior valor adicionado, produzidos
pela indústria, incorporam e disseminam maior progresso técnico para o restante
da economia.
O processo de desindustrialização no Brasil tem sido
considerado precoce, porque ocorre em um estágio em que o nível de renda per
capita é inferior ao que os países desenvolvidos tinham no início do processo
de industrialização. Nos países desenvolvidos, que em alguns casos se
desindustrializaram, a indústria nacional já cumpriu o seu papel no desenvolvimento
econômico, colocando a renda per capita da população em elevado patamar.
Ao
se desindustrializar, o Brasil está perdendo a sua maior conquista econômica do
século XX. Entre 1930 e 1980,
a economia brasileira cresceu a elevadas taxas (6,8%
entre 1932-1980) com base no chamado “processo de substituição de importações”,
com fortes incentivos estatais à industrialização através das políticas
cambial, tarifária e fiscal. Será que vamos colocar todo esse esforço a perder
e regredir à economia primário-exportadora do século XIX?
Há que se considerar ainda que parte do processo que resulta
em uma concorrência que destrói parte expressiva da produção industrial
nacional decorre de um modelo macroeconômico que vem desde o início do Plano
Real, em 1994, fora alguns pequenos interregnos de crises internas e externas,
operando com taxas de câmbio bastante desfavoráveis à produção industrial no
Brasil, como reflexo das elevadas taxas de juros praticadas no país e da
liberalização financeira. Assim, a liberalização comercial associada à
liberalização financeira têm constituído um ambiente excessivamente hostil à
produção industrial doméstica.
O desenvolvimento do Brasil não deve depender das
exportações de commodities, pois isto nos torna diretamente dependentes dos centros
de crescimento mundial. O que está acontecendo neste exato momento é
ilustrativo do fenômeno: a crise global e a desaceleração do crescimento chinês
estão derrubando o preço do minério de ferro e outras commodities, com
importantes consequências sobre a balança comercial e a produção brasileira. É
ilusão achar que vamos dar conta de gerar renda e milhões de empregos de
qualidade para os brasileiros tendo como eixo dinâmico da economia as
exportações de commodities.
José Álvaro Cardoso Economista e técnico do DIEESE em Santa Catarina.
Adhemar Mineiro Economista e técnico do DIEESE no Rio de Janeiro.